segunda-feira, 29 de outubro de 2007

A conta não fecha

Ribamar Oliveira, email: ribamar.oliveira@grupoestado.com.br

O Estado de São Paulo

A aritmética está sendo desrespeitada pelos políticos que negociam com o governo a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Não é possível destinar 10% das receitas brutas da União para a saúde e, ao mesmo tempo, reduzir a carga tributária do País. A conta não fecha. Mais recursos para a saúde resultarão em pressão adicional por mais receita, mantida a diretriz da atual política fiscal, em que todos os gastos sobem. Pelo andar da carruagem das negociações, a tendência é de elevação da carga tributária e não de queda.

Já está claro que o governo não conseguirá resistir às pressões da bancada da saúde no Congresso, que luta pela regulamentação da emenda constitucional 29. Esta emenda definiu os recursos mínimos para as ações e serviços públicos de saúde, mas nunca foi regulamentada, pois o governo nunca deixou, com receio de ser obrigado a destinar mais dinheiro para a área.

Mas agora não há como escapar. Com a ajuda do presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chignalia (PT-SP), que é médico sanitarista, o projeto que regulamenta a emenda 29 poderá ser votado esta semana. Ele destina 10% das receitas totais da União à saúde, o que representaria um aumento de R$ 20 bilhões em relação ao que será gasto este ano pelo governo federal.

Os gastos federais com a área de saúde cresceram muito durante o governo Lula. Em 2002, eles totalizaram R$ 24,7 bilhões. Em 2007, a previsão é de que fiquem em R$ 45,8 bilhões - crescimento nominal de 85,4% em cinco anos. As despesas municipais com a saúde passaram de R$ 12 bilhões em 2002 para R$ 23,7 bilhões em 2006. Nos Estados, os gastos passaram de R$ 10,7 bilhões para R$ 18,6 bilhões no mesmo período.

Em reunião com secretários estaduais de saúde, na semana passada, Chignalia disse que não era possível o governo federal elevar suas despesas com a área de saúde em R$ 20 bilhões de um ano para o outro. Ele ponderou que será necessário fazer esse aumento de forma escalonada. Mas faltou explicar como é que serão destinados mais R$ 20 bilhões para a saúde sem cortar os outros programas do governo. É impossível reduzir os gastos de custeio nessa magnitude.

Os senadores do PSDB querem também que o governo comece a reduzir a carga tributária. Uma proposta é diminuir a alíquota da CPMF. Outra é desonerar os investimentos em saneamento básico. O risco que se corre é que mais uma vez a conta seja fechada com um corte nos investimentos públicos em infra-estrutura, tão necessários para a retomada do crescimento.

O governo não quer limite para a dívida

Desde agosto de 2000, o Senado evita votar a resolução que fixa um limite para o endividamento da União. Por uma razão simples: o governo não quer. Os senadores aprovaram limites para as dívidas Estaduais e municipais, que estão em vigor, mas deixaram a União de fora. O governo de Fernando Henrique Cardoso fez de tudo para que a resolução não fosse votada. A mesma coisa acontece com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. É curioso que os senadores tucanos queiram, agora, instituir o limite.

Pela proposta que está no Senado, o endividamento da União não poderá superar 3,5 vezes sua receita corrente líquida. O primeiro relator da resolução foi o ex-senador tucano Lúcio Alcântara (CE), que também era o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), onde está a proposta. Durante o primeiro mandato de Lula, o relator foi o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), que era líder do governo. Agora, o relator é o senador Romero Jucá (PMDB-RR), também líder do governo no Senado.

O governo é contra, explicou o senador Mercadante a este colunista, porque em um eventual choque externo de grande magnitude, não haveria como controlar o endividamento. Isto já aconteceu no passado. Na crise cambial de 1998/99, lembrou Mercadante, o País perdeu US$ 70 bilhões em poucos meses. A taxa de juro foi elevada (chegou a 45% ao ano) e a taxa de câmbio disparou. Por causa disso, a dívida explodiu.

A dívida líquida do setor público passou de 42,6% do Produto Interno Bruto (PIB) em dezembro de 1998 para 53,3% do PIB ao final de 2002. No caso só da União, a dívida consolidada líquida chegou a 3,4 vezes a receita corrente líquida no segundo quadrimestre de 2001. Muito perto do limite.

Para Mercadante, a União não pode ser submetida à limitação do endividamento porque tem a responsabilidade com a gestão da moeda, o que não ocorre com os Estados e os municípios. O senador acha importante discutir outra forma de limitação dos gastos públicos federais, o que parece ser a preocupação dos senadores tucanos. Para ele, é possível construir um pacto pelo crescimento, com o controle dos gastos na base do entendimento.

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