quarta-feira, 27 de junho de 2007

Palocci, depois da tempestade


Por Anselmo Massad [27/6/2007] Revista Fórum

Durante todo o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o principal e mais constante tema de críticas por parte da Fórum foi a política econômica adotada pelo governo federal durante o primeiro mandato do petista. Longe de estar isolada na análise, a defesa de ações voltadas a um crescimento econômico mais intenso era o centro das cobranças direcionadas ao então ministro da Fazenda Antonio Palocci.

Depois de sua queda da pasta econômica do governo federal em meio à crise política de 2005/2006 e da eleição, Palocci compilou sua versão da passagem pelo poder no livro Sobre formigas e cigarras (editora Objetiva), nas livrarias desde março.

Por alegação de dificuldades de agenda, a entrevista solicitada foi sendo adiada a partir de então, até que o agora deputado federal propôs respostas por e-mail. Fórum aceitou condicionando a publicação à consistência das respostas às 14 perguntas, o que de fato ocorreu. Confira a íntegra.

FÓRUM – No livro, o senhor usa a expressão “tiro de canhão” de dentro do governo para definir as declarações da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, em entrevista a O Estado de S.Paulo na qual ela qualificou como “rudimentar” a proposta de déficit nominal zero. A impressão, na leitura do livro, é de que se trata da única demonstração de ressentimento com a postura de algum membro do primeiro escalão do governo. Essa impressão é correta?

ANTONIO PALOCCI – Não, definitivamente. A ministra Dilma utilizou a palavra “rudimentar” naquela oportunidade porque o ministro Paulo Bernardo havia apresentado um estudo muito preliminar sobre perspectivas fiscais. Quando usou a palavra “rudimentar” a entrevista pareceu agressiva. Mas para quem conhece a ministra Dilma sabe que ela, muitas vezes, utiliza palavras fortes como instrumento de debate e não como agressão. De minha parte a polêmica nunca foi motivo de ressentimento. Nem nesse caso, nem em tantos outros. Seria ingenuidade pensar que faríamos uma política econômica de duro ajuste sem debates. Isso nunca me passou pela cabeça. Por isso sempre lidei com compreensão nas polêmicas com o PT ou no caso do debate com a ministra Dilma. Mas o fato é que naquele momento a entrevista provocou uma grande polêmica, na medida em que vivíamos uma crise política de grandes proporções. Foi isso que procurei caracterizar no livro. Mas ressentimento não, de nenhuma forma.

FÓRUM – Além desse caso, o senhor se ressente de outras personalidades do governo ou do partido em algum momento de sua passagem pela Esplanada dos Ministérios?

PALOCCI – No livro eu procurei demonstrar – e não sei se consegui – que considerava natural a reação do PT à política econômica. Afinal, um partido criado no movimento social e sindical, chegar ao governo e ter que, como obrigação primeira, debelar uma grave crise econômica é, de fato, uma tarefa ingrata. Por isso sempre compreendi as razões do PT ou de membros do governo. Mas ao mesmo tempo tinha absoluta convicção de que, se não enfrentássemos a crise econômica com rigor, o primeiro governo do presidente Lula iria desandar com a certeza da volta da inflação. O que ajudou foi o fato de que Lula tinha total clareza disso. Nossa aposta, mesmo nos momentos de maior pressão, que não foram poucos, era que os resultados iriam compensar o esforço e o capital político empreendido naquele momento. Ou seja, se após o esforço, viesse crescimento, geração de empregos, recursos para os programas sociais e inflação baixa, com melhora da renda, então as duras medidas se justificariam no tempo. E felizmente os resultados estão aí, mostrando que o governo acertou ao apostar num ajuste do tamanho que era necessário. As eleições de 2006 mostraram que o povo compreendeu isso perfeitamente, mais do que muitos imaginavam. Agora é hora de colher os frutos, pois o Brasil está diante de uma oportunidade econômica e social extraordinária.

FÓRUM – Setores do PT acusaram-no de encampar teses neoliberais. Como o senhor reagiu a essas acusações? Em outras palavras, sua atuação na Fazenda foi contraditória com seu histórico de militância?

PALOCCI – Desde aquele período e até hoje tenho conversado pacientemente com esses colegas do PT. Principalmente porque acredito que suas críticas são fruto de boa-fé e não de agressões gratuitas. Um aspecto fundamental que diferenciou nossa gestão econômica das chamadas práticas neoliberais foi que, desde o início, trabalhamos na construção de um processo de recuperação econômica inclusivo. Já em 2003, no meio da crise, começamos a elaborar os instrumentos iniciais de inclusão, como a facilitação da bancarização das pessoas pobres, eliminando taxas nas contas simplificadas, com o crédito consignado, que permitiu aos trabalhadores acesso a taxas de juros menores que a metade do que pagavam antes e a construção da unificação dos programas de transferência de renda no Bolsa Família. Quem quiser chamar isso de neoliberal que o faça. Mas o tempo tem mostrado uma profunda transformação social do Brasil a partir da combinação da estabilidade econômica e das políticas de inclusão. Considero que a política econômica socialmente justa é aquela que chega à mesa do trabalhador. No passado o Brasil já cresceu a taxas elevadas piorando a distribuição de renda. Para ser mais claro, no passado o Brasil cresceu financiado pela concentração de renda dada pela inflação. O processo de crescimento atual é qualitativamente diferente. Ele ocorre com inflação baixa, com aumento da renda e com melhor distribuição da renda na sociedade.
Leia a entrevista na integra aqui

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