quinta-feira, 19 de abril de 2007

Câmara oferece 'plano de saúde' a 'jornalistas'

do Blog de Josias

Há uma máxima no folclore jornalístico que diz o seguinte: “Quando um cachorro morde uma pessoa, isto não é notícia. Mas quando uma pessoa morde um cachorro, isto é notícia”. Existe, porém, uma exceção. Se a pessoa é jornalista e o cachorro mordido é o erário, aí a dentada não vira notícia. Deve-se ao repórter Ranier Bragon (Folha, para assinantes) a descoberta de um desses furos jornalísticos que, embora conhecido de muitos, demorou uma década e meia para acontecer:

“A Câmara oferece há pelo menos 15 anos uma espécie de 'plano de saúde' gratuito para os jornalistas credenciados a fazer a cobertura noticiosa da Casa. Eles têm à disposição cerca de 20 das principais especialidades médicas, além de exames clínicos, benesse que é estendida aos seus dependentes e a pais e mães, caso eles não tenham 'economia própria'.

Só em 2006, jornalistas ou seus familiares usufruíram de 1.874 consultas ambulatoriais, uma média de sete por dia útil. Levando-se em conta que dificilmente uma consulta particular em Brasília sai por menos de R$ 100, a conta ficou em ao menos R$ 187 mil no ano passado.

Em dezembro, havia 476 jornalistas, repórteres-fotográficos, cinegrafistas e auxiliares de órgãos de comunicação privados e públicos credenciados pela Câmara para fazer a cobertura jornalística da Casa. A Câmara, alegando razões de sigilo médico, não divulgou o nome de nenhum dos atendidos. O levantamento inclui apenas consultas, e não atendimentos de emergência.

Embora vários não usem ou tenham conhecimento do privilégio, os credenciados, além de familiares, têm direito à mordomia graças ao Ato da Mesa 44, de 1992, que regulamenta 'a prestação de assistência médica e social pelo Departamento Médico da Câmara'. Antes disso, o 'plano de saúde' para os jornalistas já funcionava, mas de maneira informal. A credencial que a Câmara distribui à imprensa é usada para a identificação do profissional e para que ele tenha livre acesso a locais como o plenário.

Um grupo de trabalho formado para rediscutir os critérios de credenciamento da imprensa na Câmara deve sugerir o fim do privilégio. A decisão final depende da Mesa, comandada por Arlindo Chinaglia (PT-SP). 'Apóio essa medida, tem que cortar mesmo. Jornalista não pode ter esse tipo de regalia', disse o correspondente da rádio Jovem Pan José Maria Trindade, presidente do chamado 'comitê de imprensa' da Câmara, agremiação dos jornalistas que fazem a cobertura noticiosa no local.

Trindade está em Brasília desde 1986 e disse nunca ter usado o 'plano de saúde' nem conhecer quem o use. Em quase todos os órgãos públicos importantes de Brasília -como o Palácio do Planalto, o Senado, o Supremo Tribunal Federal e o Banco Central- há comitês de imprensa.

No caso da Câmara, ele é composto por um espaço físico, mesas, cadeiras e armários, além de computadores conectados à internet e linhas telefônicas. O objetivo é montar uma infra-estrutura para que os jornalistas consigam repassar às suas sedes, no menor tempo possível, os acontecimentos que surgem ao longo do dia.
Os principais órgãos de comunicação possuem computadores e linhas telefônicas próprios instalados nos comitês.

O atendimento médico gratuito não é a única benesse oferecida pela Câmara a jornalistas ao longo dos anos. Na década passada, era comum a Casa bancar viagens internacionais de repórteres para que eles acompanhassem deputados ou participassem de eventos. Além das passagens, a Câmara pagava uma diária de US$ 200.”
Escrito por Josias de Souza às 08h49

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